Fixação em carros velhos (1): O Corcel velho, do meu velho pai!

 

Crônica escrita para registrar uma viagem que fizemos, em família, saindo de minha moradia no Bairro Goiânia, em Belo Horizonte, até a casa de meus pais, em Santa Luzia. Coisa de uns 30, 40 km, de muita diversão e apreensões. 

 

Gosto e CPF, todo mundo tem o seu e busca individualizá-lo ao máximo, a não ser que esteja praticando tipo de esporte não-recomendado a senhores de respeito e boa fama. 

Porém, em se tratando de gostos, já pudemos tomar conhecimento de alguns que nos deixam boquiabertos, abestalhados, embasbacados, estarrecidos e etc. Tem gente que gosta de comer salada de boldo, outros adoram carne de cachorro (se duvidam, procurem saber dos costumes de alguns dos nossos irmãozinhos do outro lado do planeta...). Outros, até, gostam de levar umas chicotadas na hora do rala-e-rola.

Mas o “gosto” mais difundido por esse Brasil afora é, sem dúvida, por carros velhos. Chego até a pensar que o problema não é só falta de dinheiro para sair guiando um Vectra 2002 pelas ruas da cidade. O que algumas pessoas parecem preferir é estar no comando – se é que existe comando nessas latas velhas – de uma Brasília 70, ou um Corcel 71, quem sabe um Fusquinha 68, uma Belina 74... Não importa a marca, basta que seja bem velho.

Pois o texticulista aqui que, de dirigir entende mal-e-mal conduzir uma bicicleta que atualmente americanizou o nome para bike, ou choferar um Citroën usado, tem uns casos deveras interessantes para contar sobre esse “esporte” predileto de algumas pessoas: dirigir carro velho!

E, o primeiro, para não dizerem que estarei mal afamando as pessoas, conto sobre um Corcel 70 que meu pai possuía, por volta de 83, 84... Àquela época, o carrinho do velho – ou seria o velho carrinho do velho? – já entrado em anos, solicitava com todas as suas forças, uma reforma geral.

A lataria batia mais que baterista de escola de samba no mês de fevereiro. O motor, fumando mais que duas de minhas irmãs e a vizinhança. O farol, bom... durante o dia funcionava muito bem. A buzina? ‘Pra quê buzina?’ perguntava meu pai, afirmando ser adepto do silêncio no trânsito.

Na documentação, a “cor do veículo” estava escrito como se fosse “branca”. Os pneus? Dois carecas e dois calvos, com calvície bastante adiantada. A caixa de marchas só tinha um probleminha: “grimpava”. Isso mesmo! Foi assim que o único mecânico que teve coragem de mexer no Corcel falou: “é... essa caixa tá grimpando, mas ainda dura um tiquitinho...”. Bom, se “dura um tiquitinho”, pra quê mexer com ela agora, não é? E assim, meu pai ia guiando seu “possante” pelas ruas de Santa Luzia.

Um dia, ao me visitar no Bairro Goiânia, lá em BH – onde antes a região inteira era conhecida como Gorduras, devido ao capim que por lá abundava (Viram, eu moro na roça muito tempo antes de me mudar para Itaúna rsrsrsrs) – ele resolveu que iríamos todos, eu, minha Marli, nosso filho Silézio – com pouco mais de um ano – meu irmão caçula, Reinaldo, minha irmã Márcia e um outro irmão, o Marcelo – geeente... como diria um colunista de vizinha cidade, como tem irmão esse texticulista!!!

Entramos todos no Corcel, isso por volta das 17 horas e rumamos em direção a Santa Luzia. Trânsito lento, veículo mais lento ainda, depois de dois “defeitos sem importância” que fizeram com que ficássemos umas duas horas parados, passamos a enfrentar a escuridão da noite. Aí, a aventura começou.

Meu pai, enxergando pouco, pediu que eu fosse acendendo o fósforo para clarear a estrada, tarefa que assumi com a ajuda de meu irmão Reinaldo, que acendia um palito e eu outro, em sintonia para que não faltasse “iluminação” no interior do veículo (?). Gastamos cerca de 5 caixas de fósforo. Foi aí que entendi o porquê do estoque de caixas de fósforo que meu pai fazia no porta-malas do Corcel.

Marli indicava a direção, com a minha ajuda, quando falávamos para o meu pai: “agora, vira para a esquerda... só um pouco... direita... vai reto, vai reto! Pára... não, não pára, pode ir...”. Marcelo ficou rouco de tanto buzinar. Ao ver uma pessoa à beira da estrada, gritava: “bi-bi, bi-bi, saaaiii”.

E minha irmã, Márcia, orava com toda a fé, devota que era ao ‘evangelicismo’. Mais de três horas depois, muitos sustos, muita adrenalina, mas com emoção na mesma proporção, chegamos à casa de meus pais. 

Viagem igual àquela, nunca mais...

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