O 'Oficial de Polícia' e suas peripécias...
Texto publicado na FOLHA, no início dos anos 2000. A história aconteceu mais ou menos como narrado, porém o 'filho presente' era o meu irmão mais velho, que me narrou o acontecido.
Quem já não quis se fazer passar por um grande jogador de futebol, um ator famoso, um político importante ou mesmo um milionário? Conheço algumas pessoas que sonham mais baixo. Elas gostariam mesmo é de serem confundidas com oficiais da polícia ou mesmo com delegados. Tem até quem faça qualquer sacrifício para se vestir com farda militar.
Tem algumas
pessoas que vão mais além: compram aquelas ‘carteiras de identificação’, nas
mãos dos camelôs. Aquelas que vêm com um brasão ou insígnia, apresentando o
portador como ‘policial’, ‘vereador’, ‘imprensa’, ‘detetive’ e outras
‘profissões’ que, a princípio, parecem pomposas aos ouvidos alheios.
E quem pensa que estou exagerando, é só perguntar a um daqueles camelôs de Belo Horizonte, quantas carteiras dessas eles vendem ao dia. Vão se espantar em saber.
Mas o fato é que, mesmo sem se apresentar com
‘carteira de autoridade’, o simples fato de se informar a área de trabalho,
causa a algumas pessoas, muito orgulho, e a outras, muito respeito. Achamos nós
que, seja qual for a profissão, deve-se ter muito orgulho, e receber muito
respeito. Mas, nem sempre é assim e, aí, acontecem fatos deveras engraçados.
Com este texticulista mesmo, várias vezes senti a
mudança no tratamento ao informar que trabalho na FOLHA, que faço parte daquele
‘seleto’ grupo da imprensa, que tanto temor e admiração causam em algumas
pessoas. Pois bem, já gastei um bom pedaço desta página, no ‘intróito’, na
apresentação de nosso assunto que, hoje, trata-se de fato acontecido há mais de
30, 40 anos, quando nós éramos jovens, corajosos e cara-de-pau.
Eis que, de férias das gráficas, oficinas de jornais e assemelhados, dei um tempo na profissão e resolvi acompanhar meu pai, em uma aventura como vendedor de planos de aposentadoria, no interior de Minas. Lá fomos, eu, meu pai e um amigo dele, de nome Jurandir. Seguimos em direção à Zona da Mata, mais precisamente, de Santa Cruz do Escalvado, terra boa onde a mãe deste texticulista e de mais sete irmãos, nasceu.
Chegando, acomodados – se
é que se consegue essa proeza – em um fusquinha 68, fomos vender nossos ‘papéis’
para os fazendeiros da redondeza. O negócio foi caminhando bem, vendemos muitos
planos de aposentadoria. Já por volta das 13 horas, mortos de fome, pegamos uma
estrada de terra, rumo à cidade, para encontrar um local onde pudéssemos
almoçar, depois tomar um banho e, lógico, várias cervejas pois o dia já estava
ganho. Cerca de 40 minutos depois, já amarelos de fome, avistamos uma ‘venda’.
Nesta venda, paramos o veículo e entramos. Fomos
extremamente bem atendidos pelo proprietário que se comprometeu em cozinhar um
frango com batata e arroz para a gente “em pouco mais de meia hora”. Enquanto
isso, nos virássemos com uma lata de sardinhas e alguns pães, além de cerveja
ou refrigerante quente e uma cachacinha, que “é para aumentar o apetite para o
frango que só a patroa sabe fazer”. Enquanto isso, deixou-nos “à vontade.
Qualquer coisa é só pedir para a Maria, minha filha. Maria, vem cá, atende os
moços”. E entrou no recinto a Maria. E que Maria. Bela, sedutora, meiga,
cativante...
Nós esperaríamos o frango por mais tempo, com gosto, só pra ver Maria passando daqui para ali, dali para mais adiante e retornando ao ponto inicial...
E nesse “ver Maria”, estávamos os três, meu pai, eu e o Jurandir, quando entrou no local um cabo da Polícia Militar. Eu, mais novo, menos experiente, recolhi-me nos gracejos e olhares sedutores.
O Jurandir, que
tinha ‘medo de polícia’, aquietou-se num canto. Mas, meu pai, boêmio, vivido,
continuou nas brincadeiras, nos elogios a Maria, num verdadeiro quase-assédio. Eis
que o cabo não gostou. “O senhor respeita minha noiva, ou levo todos em cana!”,
sentenciou. E já foi logo pedindo os documentos “para averiguações, nunca se
sabe de onde são os forasteiros...” (e hoje, com minha vivência, teria
respondido pra ele que, se soubéssemos de onde vêm, não seriam forasteiros).
Aí, nesta apresentação dos documentos, aconteceu o inesperado. Ao apossar-se da carteira de meu pai, imediatamente o cabo 'juntou os calcanhares e bateu continência', ficando em posição de sentido. Meu pai, malandro como ele só, descobriu no ato o motivo da atitude do cabo.
Ele, meu pai, Sebastião Fernandes da Cunha, sempre trabalhou na Imprensa Oficial, onde aposentou-se após trinta e cinco anos de serviço e, para azar do cabo, entregou-lhe a carteira funcional da Imprensa Oficial, onde estava inscrito “I. Of.”, abreviaturas daquela instituição, além de constar o indefectível carimbo em vermelho “imprensa” e uma tarja verde-amarela no centro.
OcCoitado do cabo, entendeu tudo errado e achou que meu pai era ‘Primeiro Oficial’, destacado para o setor de Comunicação da Polícia. Com isso, meu pai fez com que o cabo marchasse, virasse à direita, à esquerda, ficasse em posição de ‘sentido’, enquanto comíamos o frango e flertávanos com Maria.
Fomos embora, depois de alimentados e nunca mais
voltamos. Já imaginaram se o cabo descobrisse a verdade?
A Maria? Ah... ela era bonita mesmo. Bonita ao ponto
de ter valido a pena a molecagem do meu pai... rsrsrsrs
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