O Solón pensa que eu sou burro?

 

Há alguns anos, o jornalista José Waldemar, meu amigo e mestre, que tratamos como Zé Waldemar, em Itaúna, foi candidato a deputado estadual e eu o ajudava na campanha. Um dia, saímos de Itaúna em direção a Pirapora, onde um conhecido em comum, de nome Solón, prometera a ele fazer campanha lá na terra “aonde o peixe pula” [Pirapora = pirá (peixe), pora (pulo) em tupi-guarani].  

O nome Pirapora se dá, dizem, em alusão a um trecho do Rio São Francisco naquela linda cidade do Norte de Minas, onde a calha do rio é pedregosa e a partir dali o rio se torna navegável. Os peixes, ao 'subir o rio', pulam naquele local... Bom, mas a história aqui é outra. 

Fomos, eu e o Zé Waldemar a Pirapora, conversar com os pretensos cabos eleitorais da campanha.

Lá chegando, fomos à casa do Solón, como combinado, e encontramos umas 20, 30 pessoas, reunidas na sala da moradia. O candidato ocupou uma cadeira no centro da sala e eu fiquei em um canto, de frente para ele. Feitas as apresentações, pelo anfitrião, Solón começou a explicar que ali estavam seus amigos, ‘da igreja’, e que se dispunham a fazer a campanha naquelas terras do Norte mineiro. “O pastor ‘tal’, vai conseguir uns 5 mil votos lá pelas bandas do Guaicuí” – que é o local onde os rios ‘das Velhas’ e ‘São Francisco’ se encontram e, mais importante, ainda, local onde Minha Marli veio ao mundo. 

E continuou o Solón: “na Palma – Várzea da Palma, cidade vizinha – o pastor (e dizia o nome) vai arranjar uns 10 mil votos. Já no Buritizeiro – o pastor ‘tal’ vai dar mais uns cinco a oito mil votos. Aqui, em Pirapora, eu e meus amigos conseguimos mais uns 20, 25 mil votos...”.

Fiz as somas das promessas de votos e já eram cerca de 40, 45 mil... E a partir desta quantificação de votos prometidos, o Solón passou a falar do que precisava para a campanha: “lá na (Várzea da) Palma, vamos precisar de uns quatro, cinco carros. Em Buritizeiro, uns dois. Aqui, em Pirapora, entre 5 a oito. Mais um para o Gauicuí (Barra do)... e também vamos precisar contratar umas 100 pessoas, ao todo... já tenho os nomes. E uns R$ 15 mil, R$ 20 mil, para as despesas gerais, talvez um pouco mais...” e ia relacionando as despesas, uma a uma: gasolina, lanches, transporte... Seria uma campanha de candidato endinheirado, como notei.

Após todo o relatório, Solón se dirigiu ao Zé Waldemar, com a voz arrastada, como é comum ao sotaque daquela região: “e então, Wal-de-mar (que era como ele se dirigia ao meu amigo), quando podemos começar?”

Aí, pairou um silêncio na sala, em que se podia ouvir o batido das asas de um mosquito. Todos esperando a resposta. 

Zé Waldemar se levantou e, como se mais ninguém estivesse na sala, se dirigiu a mim e disse: “vamos Sérgio!”. Levantei e saímos. Deixamos os 'cabos eleitorais' à espera da resposta.

Fomos almoçar o Restaurante do Egnaldo, onde se serve um Surubim na brasa, digno de citação no Guia 4 Rodas. 

Voltamos a Itaúna e nada de o Zé Waldemar falar da proposta feita pelo Solón. 

Passou a campanha, um ano depois, na Praça da Matriz, em um domingo, conversando sobre amenidades, como fazíamos sempre aos finais de semana, o Zé Waldemar se dirigiu a mim, como se o ocorrido em Pirapora tivesse sido na véspera: “o Solón acha que eu sou burro?”

Demorei uns segundos para entender a pergunta, lembrei da ida a Pirapora e respondi: “é, parece que sim, mas quebrou a cara...” E não se falou mais nisto, rsrsrsrsrs

Comentários

  1. Morri de rir....Principalmente por conhecer o Zé Waldemar....trabalhei com o Clênio, irmão dele...e de vez em quando ele aparecia no escritório...Itaúna tinha um Solón...seria o mesmo?....

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